sexta-feira, agosto 29, 2003

ASSIM VÃO AS GLÓRIAS DO TUNING – Terceira, e última, parte

Boa noite aos ouvintes da Rádio Renascença e ao meu fiel auditório

Quem é que nunca ouviu falar da monumental concentração no Centro de Exposições (CNEMA) de Santarém? (1) As peregrinações à Meca do ramo (assim como outros ajuntamentos populares, para as bandas da margem sul) funcionam como factor de congregação dos tuners, proporcionando um fortalecimento dos laços comunitários e permitindo a troca de artefactos e experiências. O lencinho/bandeira da "América" que costuma revestir o encosto de cabeça encontra aqui uma verdadeira legião de zelotas, sendo que alguns "fiéis" exibem orgulhosamente um CD no pára-brisas (ou um gigantesco e racing autocolante). No entanto, entre as esferas mais elitistas essa predilecção pelo CD é já vista de soslaio, como se de coisa de bimbo se tratasse. Em terra de cegos...

Os rituais de acasalamento são particularmente complexos. Com vista a impressionar o sexo oposto, os varões pavoneiam orgulhosamente o boné-colorido-com-óculo-escuro-à-pendura, tipo caranguejo-eremita. O recurso a flashes de luz azul –escolha muito popular para iluminação do habitáculo- resulta num efeito atordoante sobre a dama, sendo que as baforadas de monóxido de carbono dão cabo do resto das defesas. Deslumbram igualmente com o ronco do seu poderoso escape de rendimento, ou com a pressão sonora debitada pelo seu sound system (2). As corridas de quadrigas à bimbo e os "picanços" no semáforo são meios privilegiados para destrinçar os machos dominantes. Os outros ficam com o joio. E já gozam.

Outro elemento potenciador da coesão do grupo reside nas manifestações de carácter musical. Os membros do grupo juntam as suas "montadas" em manada, partilhando com o meio envolvente as suas preferências musicais (3) Podem surgir nestas ocasiões reacções hostis ao fenómeno tuning, nomeadamente quando a assembleia de reúne numa área residencial depois das onze da noite. Este desagrado é geralmente consubstanciado em palavras de ordem do género "Calem-se com essa merda!!!" ou "Eu amanhã trabalho, cambada de gandulos!!!!"

Consoante a tribo a que pertencem, as preferências musicais dos entusiastas do tuning podem ser segmentadas geograficamente: o "kizomba" e o "kuduro" são mais populares nos subúrbios, enquanto que o bom velho "pimba" tem mais discípulos nos meios rurais. As pistas de carrinhos-de-choque são meios privilegiados de difusão dessa musiquinha de meia pataca. Bem, chamar música a esse "áudio-refugo" de meia tigela poderia ofender algumas virgens mais puristas e fazer o maestro António Vitorino de Almeida fazer uma roleta inteira na tumba. Ah...o distinto senhor ainda não morreu, pois é...Realmente, o velhote vende saúde e vitalidade. Tenho impressão que na altura em que fazia aqueles programas com a Barbie Guimarães, o nosso amigo maestro ainda a terá convidado a ir lá a casa ver a colecção de partituras...

Não obstante as diferenças no gosto, é possível encontrar um denominador comum: seja o que for, tem de se ouvir a dois quarteirões (4), sendo essa a fasquia mínima para se conseguir o respeito e admiração do grupo. Na verdade, qualquer tuner que se preze tem necessariamente que exibir um poderoso sound system, sob pena de ser o alvo de comentários jocosos no seio da comunidade. Faz todo o sentido ter no interior do veículo uma panóplia de tupperwares sofisticados (chamados woofers e subwoofers) susceptíveis de reunir uma manada de mais de mil watts, porque pode ser sempre preciso abrilhantar as festividades de um qualquer bailarico, caso falhe a luz ou coisa assim. À excepção desta vital função social, não encontro mais nenhuma explicação possível para esse prazer insondável de gramar com a musicalidade própria das obras do Metro do Porto pelo tímpano adentro, fritando o resto do cérebro onde, até ver, ainda se vai registando alguma actividade.

E pronto, portugueses e portuguesas, acho que é tudo por agora. Fico à espera das vossas reacções a esta provocação. Venham de lá esses bilhetes postais para o marco do correio do Hyde Park, santuário do escárnio e maldizer.

(1) Não convém confundir com as exposições de gado que se realizam sensivelmente no mesmo local, sob pena de gerar lamentáveis equívocos; para que o estimado leitor, não confunda as espécies, fica a seguinte mnemónica: as vacas são as que têm mais manchas, os bois têm os cornos maiores e os tuners são os que têm os carros rebaixados.

(2) Dito assim, em estrangeiro, resulta que nem faca quente na manteiga dos corações das pestanejantes damas

(3) Quer o meio envolvente queira, ou não...

(4) Segundo o disposto nos cânones da ITF (International Tuning Federation)

terça-feira, agosto 26, 2003

ASSIM VÃO AS GLÓRIAS DO TUNING – Parte II (é melhor ler primeiro a outra)

Boas noites, portugueses e portuguesas
Geograficamente falando, o.... Espera aí!!! Com que então, tenho que mudar a minha saudação ao auditório deste ciber-pasquim?!!! Já comecei a ouvir bocas reaccionárias denunciando um suposto guterrismo recalcado neste meu endereçar à Nação... Gentinha...Bem, voltemos à descontrução do fenómeno tuning , deixada em banho-maria desde a nossa última amena cavaqueira.

Onde é que eu ia...? Ah, ok... Geograficamente falando, o fenómeno social em análise começou por se evidenciar principalmente nas grandes metrópoles e respectivos subúrbios. Não bastavam já todas as outras doenças sociais, ainda tivemos que aprender a gramar mais uma...No entanto, a "ideologia do boné e da suspensão rebaixada" acabou por se disseminar até aos meios rurais, sendo que mesmo o lugarejo mais remoto terá –além do clássico bar de alterne- um "tunerzito". Por "tunerzito" não se entende nenhuma subespécie de "tuner" anão, mas sim um entusiasta de alma e coração, mas tristemente limitado por condicionantes financeiras. Trata-se de um zelota irredutível, que não se deixa desanimar pela adversidade: tem que "kitar" qualquer coisa no seu veículo, nem que seja o ambientador do habitáculo...Claro está, com aroma a pinho ou maçã "racing", encimando a incontornável imagem de Nossa Senhora.

O que move estes peregrinos em busca da Jerusalém do Alcatrão ou da Área de Serviço Eterna? Uma das explicações possíveis é mais previsível que o final dos "filmes-pipoca-para-toda-a-família" (1) das tardes do fim-de-semana: miúdas. Porém, como vamos ver já de seguida, essa explicação tem qualquer coisa de paradoxal. Se pararmos um minuto para contemplar a fauna do sexo feminino que povoa o universo destes "chaimites-com-saias-de-plástico", veremos que essa hipótese se esvai mais rapidamente que os croquetes e martinis que são servidos nos casamentos, enquanto os noivos acabam de tirar aquelas fotografiazinhas apaixonadas (2) para a posteridade.

Em abono da verdade, as meninas que –regra geral- ocupam o lugar do pendura, não são propriamente um expoente de beleza. Feitas as contas, é muitas vezes necessário juntar vários especimens, por forma a conseguir reunir um exemplar de dentição completa...A boca em forma de "baliza" de formato anatómico, oferece um mundo de possibilidades não negligenciáveis ao "tuner" (3). Importa no entanto frisar que há algumas ovelhas tresmalhadas no meio deste aterro de metal e plástico, meia dúzia de miúdas giras muito mal empregues. Mas enfim, há gostos para tudo. Se há quem aprecie verter cera quente sobre os próprios mamilos, porque não...? Tudo vale a pena, como dizia o poeta.

(1) Estes atentados audiovisuais passam-se inevitavelmente numa colónia de férias à beira de um qualquer lago nos "Estates" , com canoas, pinheiros e uma estudante estrangeira com um deslumbrante suporte peitoral. Como se de um bolo de iogurte se tratasse, estas películas açucaradas contêm incontornavelmente os seguintes condimentos: um puto estúpido, um cão traquina (amigo do puto estúpido) e um atrasado mental que faz de mau da fita, a quem acontece tudo e mais alguma coisa.
(2) Estes momentos azul-e-ouro têm uma banda sonora muito própria, desta feita caracterizado por expressões do género "Ora venha de lá mais um beijinho...click, click", "Agora olhe para a noiva...isso...click...Tente sorrir, por amor de Deus...!!! Click". Noutra esfera, poderemos encontrar casualmente o melífluo despique, em jeito de relato futebolístico:
"-Eu é que gosto mais de ti, coração!!" – dribla a senhora vestida de branco.
"Não, eu é que gosto mais, minha nuvem de algodão-doce!!" – contra-ataca o noivo.
"SOU EU QUEM GOSTA MAIS, MEU TORRÃOZINHO DE ALICANTE!!! E SE NÃO TE CALAS IMEDIATAMENTE, LOGO À NOITE VAI HAVER TRABALHO DE CASA PARA O TEU BÍCIPE DIREITO!!!" Remate cirúrgico, sem a mínima hipótese de defesa. Golo da noiva.

(3) Sobre estas sinergias dentárias, vide Silva, Pedro Da boca balizeira e outras reflexões transcendentais
Dedico estas breves linhas à minha amiga Pica, senhora de dois poderosos braços e de um ainda mais portentoso sentido de humor. Não perca o último episódio da Trilogia Tuning, no sítio do costume.
Boa noite, Ponta Delgada

Hoje vim cá dar um jeito à barraquinha das farturas e aproveito para dizer duas coisas:

Em primeiro lugar, acabei de inaugurar o sebastianicamente aguardado Fórum da Boca Reaccionária. É verdade!!! Basta clicar no "link" do "Comments" e o vosso ultrajezeco aparece miraculosamente impresso no éter. Vá lá, vão ver que não dói nada. Aliás, vou desde já instituir um prémio para a primeira víti...digo, felizardo que queira ver publicada a sua boca, comentário, opinião, quadra popular, anúncio de venda de automóvel, grito de indignação, etc...O primeiro a pôr a carta no marco do Hyde Park ganha o direito a convidar-me (e pagar, claro está) para jantar. Hã, que maravilha de proposta, não é!? Escrevam, façam-se ouvir, porque este espaço terá infinitamente mais interesse quando for enriquecido com as vossas ideias. Imaginem, podemos criar aqui uma pequena comunidade virtual, onde todos podem andar à cabeçada. Fantástico, não é? Mostrem que o 25/04 serviu para alguma coisa. Insultem-me, se for esse o caso. Mas façam-se ouvir.

Em segundo lugar, vim cá deixar um pedacinho de céu escrito por uma tal de Celeste Holm:

"O animal que quase todas as mulheres gostam de se ver revelar nos homens é a marta."

in Manual dos Cínicos, de José Manuel Veiga

segunda-feira, agosto 25, 2003

ASSIM VÃO AS GLÓRIAS DO TUNING – Parte I

Boa noite, portugueses e portuguesas

A vítima, digo tema, desta noite é essa maravilha dos subúrbios, que dá pelo nome de tuning . E o que raio é isso? Pois bem, estamos a falar dessa esperançosa alquimia que visa transformar um pobre Daewoo Matiz num verdadeiro demónio do asfalto, ou, se preferirem, um carapau anémico numa barracuda recordista das 20000 léguas submarinas. A minha ideia é fazer um daqueles documentários à la Canal Odisseia; só que em vez dos animaizinhos e dos indígenas com penachos na cabeça, vamos ter carros cor-de-rosa e gajos com bonés e fio-de-ouro-com-medalinha ao pescoço. Ok, parece que é desta que vou ganhar o cartão da casa do São Francisco Xavier. Bem, já que nunca me deixam entrar na Kapital, sempre é meio consolo...

Desde o clássico Fiat Uno (que Deus o tenha) até ao Porsche topo-de-gama, as "montadas" são alvo da mais revoltante barbárie, ao jeito do gosto e do bolso do verdugo. Sim, é um meio essencialmente masculino, uma espécie de "festa da mangueira" com carros (geralmente) pirosos e um som muito "bum tchibum". Se "o cão é o melhor amigo do homem", não deve ser subestimada a relação que se estabelece entre o tuner e o seu amado veículo. Como acontece com qualquer casal, não é raro ouvir comentários enciumados do género "Olha que eu vi-te a galar o Subaru!!!", ronronados com mágoa pelo motor do cônjuge traído.

Esta seita reúne-se em templos chamados Oficinas de Preparação. Nestes antros de perdição, a concentração de cromos/metro quadrado chega a bater os já formidáveis valores alcançados pelos núcleos de Electrotecnia nas escolas secundárias...Dão pelo nome de Preparadores, os sacerdotes encarregues da realização dos rituais de iniciação na comunidade tuning . Os elementos recém-chegados são tosquiados até ao tutano, numa cerimónia profundamente simbólica chamada "circuncisão financeira". Os olhos esbugalhados e o constante fluxo de saliva são um dos sinais visíveis da veneração que os iniciados nutrem pelo trabalho dos Xamãs do Pistão (outro nome pelo qual são conhecidos os Preparadores).

A montada exige –além de muito amor e carinho- uma miríade de acessórios, em quantidade maior que a encontrada na também recordista malinha de mão de senhora. Ora, vejamos: escape de rendimento, velas especiais, jantes de liga leve, filtros de ar especiais, bacquets (francês para "Deste esse montão de contos de réis por uma merda de um banco???!!!) de competição, rede tuning (para deixar respirar a máquina) e até mesmo um insuspeito tapete para os pés.

Até já estou até a imaginar o paleio do vendedor: «Sabe, este não é um tapete qualquer. Na verdade, o artigo que tenho nas mãos dispõe de uma capacidade de armazenagem e dissipação de pó, dez vezes superior à de uma vulgar carpete de sala de estar. A tecnologia "ácaro-free" permite ao piloto concentrar-se na condução, confiante no escudo invisível que aparta os seus pés dos perigosos microrganismos. Este expoente de tecnologia têxtil foi desenhado num túnel de vento e submetido às mais duras condições por forma a garantir estabilidade e conforto a toda a prova. Você não vai acreditar, mas estes 600 centímetros quadrados são, nem mais nem menos, o tapete oficial da NASA!!!!»

Neste momento, a marcha do Tempo pára. Os olhos do tuner faíscam como relâmpagos, mais ainda que os da Margarida Martins em frente da montra de uma pastelaria. O nosso herói rejubila, sabendo-se de antemão o alvo da mais profunda inveja de todo o clã, regressado ao acampamento com uma imponente peça de caça às costas. Esse evento memorável (mais ainda que o afamado espectáculo do Tony Carreira no Olympia de Paris) produziria inevitavelmente reacções do género: «Man!!! O tapete oficial da Nasa??!!!! F**a-se!!! (loooonga pausa) (...) Mas...ó Ricky, meu irmão...essa Nasa...é a tua dama...?»

O vocabulário usado dentro destas comunidades tende a revelar-se algo rudimentar, sendo que a comunicação assenta basicamente em expressões avulsas como "minha dama", "racing", "Vêm aí os ******-**-**** da Brigada!!", "racing", "Comia-te toda!!!" , "racing", "ratérada", "racing" e o já mítico "F***-se!!! G´anda som!!!" Há outro leque de expressões que tende (infelizmente) a relacionar-se umbilicalmente com o fenómeno tuning. Entre as mais vulgares encontramos clássicos como "Unidade de Desencarceramento", "Unidade de Cuidados Intensivos", "0RH negativo" e "prótese".
Não perca as cenas dos próximos capítulos, num ecrã perto de si.

quinta-feira, agosto 21, 2003

"E O NECAS QUE JULGOU QUE ERA CANTORA..."
Boas noites, portugueses e portuguesas
A minha breve ausência deste fórum esteve directamente relacionada com uma agradável estadia numa estância hoteleira da capital. Coisa barata e requintada, com uma excelente vista para os cacilheiros. Serviço de quartos esmerado. Cinco estrelas. A bem dizer, estive a fazer umas mini-férias nos Cuidados Intensivos do São Francisco Xavier, fruto de um amistoso "tête-à-tête" com um grupo de admiradores desse Belzebu-do-bigodinho, o senhor Abrunhosa.
Antes de começar o fogo-de-artifício, queria só dizer que estou a pensar criar um "Correio do Leitor", publicando os comentários de quem assim o quiser. Claro está, se eu não gostar do teor das bocas, tenho a faca e o flamengo na mão...Bem-aventurada essa instituição salazarenta que é a censura, santa padroeira das entes com poderes editoriais.
Então não é que fui acusado de praticar um "linguajar requintado de p**a de 5 contos"? A bem dizer, não faço ideia dos honorários praticados pelas profissionais do ramo, embora tenha uma ideia muito concreta do requinte e sofisticação do latim empregue pelas mesmas. Prometo desde já corrigir essa lacuna imperdoável numa próxima edição. Ai, o que eu não faço pelo meu auditório, valha-me Deus... Agora que falamos nisso, caso viesse a arrendar o meu real coiro, nunca cobraria menos de trinta milenas. No mínimo. Para que conste.
Isto faz-me lembrar a única vez em que fui abordado, na Avenida da Liberdade, às três da manhã, numa gélida noite de Dezembro. Ah, e as folhas caíam. Sucede que uma senhora de vestes minimalistas se acerca da minha pessoa e –mercê de um marketing directo e agressivo- se propôs embaciar as lentes dos meus óculos através de um método bestialmente original. E vamos ficar por aqui, enquanto ainda me restam pelo menos dois vinténs de pudor. Adianto apenas que fiquei perturbado com a simples visualização mental da proposta e ainda hoje tenho pesadelos horríveis, onde um Gremlin de "tigresse" e peruca loura (ou seria a Odete Santos...? já não me lembro) me tenta lançar um jacto de vapor de água à cara. Acordo a suar, apressando-me a verificar se as minhas lentes ainda conservam a sua virginal transparência...
Mas chega de conversa sobre mulheres da vida, porque este é um blogue de boas famílias e estrutura moral férrea, fazendo questão de se pautar por um conteúdo edificante e promotor de sólidos e intransigentes valores tradicionais. E prometo que nesta tribuna, a língua portuguesa, o regime monárquico e os demais baluartes da Nação serão sempre...Eh, pá!! O que é que se passou aqui?! Está visto que o espírito de direita que há em mim voltou a fazer das suas. Enfim, já passou, graças ao meu kit de emergência: uma foice e um martelito de madeira, prontinhos a sanar qualquer exuberância direitista. No entanto, rapaziada, quero deixar um sério aviso à navegação: cuidado ao abrir essa tenebrosa porta dimensional e trazer cá para fora o Paulo Portas que há em cada um de vós; com efeito, estudos recentes comprovam que sete em cada dez portugueses passam subitamente a ganhar uma especial apetência por chiffon e plumas, calcorreando esses cabarets lisboetas como glamorosas e sedutoras Rainhas da Noite. Atrevo-me a citar o Sérgio Godinho, na sua "Lisboa que amanhece":

"E o Necas que julgou que era cantora, que as dádivas da noite são eternas...
Mal chega a madrugada, tem que rapar as pernas,
Para que o dia não traia
Dietriches que não foram nem Marlenes..."

Entre duas simpáticas notícias envolvendo homicídios entre famílias ciganas e tráfico de órgãos, li no Correio da Manhã que se espera um "baby-boom" no Canadá, daqui a coisa de nove meses. Está-se mesmo a ver: culpa do apagão. Se a moda pega em Portugal, quase apostava que a típica carantonha matinal lusitana passa a espécie em vias de extinção...Já imagino os diálogos:
"-Bom dia, sra. Dra.?!! Está com muito boa cara!!"
"-Ah, sabes, ando a tomar umas injecções..."
Oh, sim, aquilo é seria boa disposição e amor fraternal no escritório...Mas não brinquemos com coisas sérias, pois anda para aí uma organização terrorista de cegonhas-kamikaze, apostada em fazer em fanicos a rede eléctrica nacional. Ah, pois!!! Mas a mim, ninguém me cala!!!

quinta-feira, agosto 14, 2003

DEZ RAZÕES PARA NÃO SUPORTAR O PEDRO ABRUNHOSA
Boas noites, portugueses e portuguesas
Antes de mais (e para responder a algumas bocas mais venenosas que uma reunião Tupperware de cobras-capelo) eu fabrico estas modestas missivas a horas supostamente impróprias porque trabalho até à meia-noite e é quando tenho tempo para o fazer. Aproveito para desfazer também esse outro equívoco: não, não trabalho em nenhuma linha gay, nem nada que se pareça. Trata-se apenas de dar dois dedos de conversa a um ou outro cavalheiro à procura do calor de uma voz afável, uma espécie de farol no negrume das intermináveis noites de solidão. Só isso. Há gentinha muito mal intencionada, sem dúvida.
Mas não foi isto que me trouxe a esta tribuna. Com efeito, vim apenas encetar uma breve reflexão sobre a figura do Pedro Abrunhosa.
É verdade, faço parte dessa imensa minoria que nutre um carinho muito especial por este senhor, uma espécie de "Nossa Senhora do Vinil", ou coisa que o valha. Deus me perdoe a metáfora. Gostaria imenso de se ver revestido da aura do "verdadeiro artista", mas acaba por produzir uma pose mais artificial que o Sunny Delight, já de si senhor de uma invejável bíblia de corantes e conservantes. Mas sobre essa mixórdia conversamos outro dia, que eu não me posso dar ao luxo de desviar a anti-aérea do prato do dia.
E pensar que aquela voz de alguém que gostaria muito de ser confundido com o Nick Cave já vendeu tanto disco... O filão já foi esgotado há muito: tivemos toda uma fornada de "franciús" a trautear aquelas melodias capazes de fazer adormecer um adolescente viciado em «ecstasy» e passar que nem faca em manteiga nos corações das jovens da época. O nosso Vitor Espadinha constitui um excelente exemplo desses tempos áureos, encantando (leia-se comendo) toda uma geração de mulheres com o seu trinar, não raras vezes mãe e filha do mesmo clã. O que interessa é que a coisa resulta; porque não ressuscitar esse elixir poderoso? E foi o que o nosso herói fez.

Lembro-me do "Viagens" (o primeiro álbum, para quem não se lembre) como se fosse hoje. A malta sabia de cor e às arrecuas aquela do "Tudo o que eu te dou". Dava um jeitão levar as amigas à praia e debitar aquele pré-fabricado lírico, dando uma de "gajo bué sensível".

O modus operandi já estava mais que delineado e assemelhava-se a uma operação militar. A saber:
#1 pôr a tocar o cd em análise
#2 manobrar com o clássico "o brilho do luar na água lembra-me os reflexos argênteos do teu cabelo", mais devastador que a táctica do quadrado em Aljubarrota (n.d.r. não avançar em cunha com o arriscado "Então, bute?", sob pena de comprometer toda a operação)
#3 declamar a referida peçonha lírica ("Tudo o que eu te dou") com olhinhos à Tony de Matos (marca registada), resultando num infalível efeito debilitante do inimigo, deixando o espaço aéreo à mercê de um voo de reconhecimento bem próximo do solo
#4 aproximação progressiva da mão à perna do alvo, desembarcando no ponto pré-fixado e removendo à sua passagem eventuais obstáculos à progressão da infantaria, como fechos, molas, elásticos, etc...
#5 Capture the flag (bem...é como quem diz...esta, vou deixar à imaginação do estimado leitor)

Então não é que depois de tudo isto, ainda tenho a lata de vir dizer que fui a um concerto desse cavalheiro.... !!!??? Pequei, irmãos, é a mais pura verdade. Tinha menos uns quantos anos em cima e, em abono da verdade, era um bocado cromo. Ainda hoje guardo com um afecto paternal o bonequinho de palha com a efígie do amigo que me convidou, religiosamente acompanhada de um caixinha de agulhas.

P.S. – Acabo de ouvir na rádio uma música do Olavo Bilac (Santos&Pecadores). Volta, Pedrinho, estás perdoado...

sábado, agosto 09, 2003

AS PATILHAS DO SENHOR ENGENHEIRO E OUTRAS HISTÓRIAS
Boas noites, portugueses e portuguesas.
Então não é que vão calar o bico a essa personagem incontornável da televisão portuguesa, o Carlos Pinto Coelho??!!! O homem já fazia televisão antes da chegada dos mamíferos ao planeta e agora querem empurrá-lo da cadeira, como se fosse um Salazarzito da Cultura a precisar de reforma. Querem acabar com o Acontece, vá-se lá saber. Como diria um inflamado (e carregadinho de razão) adepto do Benfica, em relação à demolição da Catedral da Luz: "Qualquer dia deitam abaixo os Jerónimos!!!!". Pois muito bem, isto seria um ultraje tão grande como proibir o Prof. Hermano Saraiva de educar as nossas criancinhas com as suas didácticas estórias de Portugal, num programa mais saturado de teor educacional que as garrafas daquela trampa do Gud. Sim, essa laranjada pastosa. A verdade é que o velhote lá vai impingindo a cassetezita, uma espécie de Testemunha de Jeová a querer vender as virtudes do Portugal antigo. Sim, porque a História morreu a 25/04 (não parece bem falar à boca cheia do 25 de Abril; é coisa de possidónio), depois disso a Terra Média mergulhou nas mais profundas Rubras Trevas, nas mãos dos senhores-comedores-de-criancinhas. Não, não era nenhuma piada sobre a Casa Pia, estava mesmo a falar dos comunistas.
Em abono da verdade, até hoje nunca recuperei do choque que foi o desaparecimento desses dois touros das lides televisivas: Vasco Granja e o Eng. Sousa Veloso.
Que saudades das patilhas esvoaçantes do engenheiro, uma referência incontornável no imaginário infantil. Era chato porque ocupavam uma parte considerável do ecrã, sobrando apenas um nichozito para a cotação dos ovos extra-A, no sobe-e-desce frenético do mercado avícola, esse Dow Jones à moda de Benavente. Dava um jeitaço à criançada saber da altura mais indicada para semear couve-nabo e outros transcendentes filhos do ventre da Mãe-Terra. OHHH!!!! MíLDIO, VOLTA!!! ESTÁS PERDOADO, ESCARAVELHO DA BATATA!!! Ainda me recordo das searas bruxuleantes e do efeito soporífero dos directos da Feira de Gastronomia de Santarém. Enfim, por alguma razão demos numa geração de cromos que falam destas idiotices com um timbrezinho saudosista.
E que dizer da frondosa careca do senhor Granja, uma espécie Taj-Mahalzinho cintilante? Aquele arzinho paternal com que se dirigia à meninada e os óculitos na pontinha do nariz faziam lembrar o Pai Natal, brindando-nos com interessantes e educativos desenhos animados de um qualquer autor polaco, tipo Malkiewicicz, Kostragjilkewicz, ou coisa do género. Aquilo é que era um banho de cultura nas manhãs de fins de semana.
Agora querem dar de comer aos peixes o último dos baladeiros. Tanta gente simpática que nunca mais morre -como o Júlio Isidro, o Nicolau, o Carlos Ribeiro- porque é que não deixam o velhote em paz?
No impuerta (sim, Rita, esta é para ti), toca a bombardear impiedosamente o e-mail da RTP (opiniao@rtp.pt) e chamar nomes aos gajos.
Não deixem morrer a utopia. "E assim acontece".

PS - Já agora, não deixe de contribuir para o fundo humanitário "André nas Maldivas", depositando o seu donativo na conta 01837438295793 da CGD. Não fique indiferente a este drama, abra o seu coração.

sexta-feira, agosto 08, 2003

A VIDA DE PI
Boa noite, portuguesas e portugueses. Acabei de sofrer o meu primeiro revés bloguista: consegui apagar o texto todo e vou ter de o escrever outra vez. Fixe. Lá se vai o "Brave New World"...Enfim, nem tudo são rosas, mas não vou vacilar perante uma adversidadezita destas, com certeza. Onde é que eu ia? Ah, sim, estava a dirigir-me à Nação. Pois, pois, porque para ser Presidente do Conselho (ou Primeiro-Ministro, como lhe chamam agora) estou mesmo no bom caminho. Passo a explicar: à semelhança do (agora comum cidadão) Guterres, também padeço de uma manifesta inabilidade para lidar com números (o célebre PIB-gate) e adoro o som da minha própria voz a reverberar no ar. Pronto! Agora só me falta o curso de Eng. Electrotécnica, que a bem dizer é o mais adequado para o efeito.
Feito este breve reparo, passemos ao que me trouxe aqui hoje: "A vida de Pi", de Yann Martel. Trata-se de um livro extraordinário, que ganhou o Booker Prize no ano passado. Não me queria alongar muito com a história (até pq alguém pode querer lê-lo) mas trata da fantástica odisseia de um rapazinho indiano, surpreedentemente cristão, muçulmano e hindu ao mesmo tempo e que questiona tudo o que vê à sua volta. O nosso herói vê-se naufragado no meio do Pacífico, partilhando a casca de noz, que é o bote salva-vidas, com um tigre de Bengala...Rodeado por um oceano infestado por tubarões, Pi Patel tenta esquecer-se da família que jaz no fundo do oceano e luta ardentemente pela sobrevivência diária, pondo em prática os ensinamentos do pai no sobre o fascinante mundo animal no mais importante teste da sua vida. Parece que já estou a ouvir o Albarran "A tragédia, o drama, o horror..."
Como diria o George Clooney, gosta mais de um bom whisky e um charuto cubano do que de uma loura luxuriante. Eu sinto o mesmo em relação a um bom livro. Temos uma coisa em comum: somos ambos grandes aldrabões.

quinta-feira, agosto 07, 2003

A MINHA PRIMEIRA VEZ...
Isto é giro...Quem diria que qualquer imbecil teria direito a um espaço para dizer as maiores enormidades que lhe venham à cabeça?
Por ora é tudo. Me visita, vai!!! Exactamente, em vez de passarem tanto tempo agarrados a esses canais do demo carregados de ninfas asmáticas.
Beijos e abraços

Baú